Pedro o enfermeiro esgotado

Enfermeiro Pedro, casado, dois filhos. Enfermeiro com mais de 15 anos de carreira. Psicologicamente esgotado. Atarefado, olheiras pesadas, pele gasta, marcas acentuadas de horas e horas de turnos. Pedro, cansado de ser enfermeiro, primeiro porque o tinham deixado para terceiro ou quarto plano, depois porque os seus ouvidos estavam carregados de pequenos hematomas com tantas exigências e queixumes. Pedro, classe média Portuguesa, se é que isso ainda existe, habituou-se cedo a contar tostões até ao final do mês. Claro que para além das 40 pesadas horas passadas no hospital, ainda tinha que fazer mais 20 horas numa clínica, e se ainda aparecesse mais um part time Pedro tentaria concorrer para o agarrar. Sim é verdade que existem muitas profissões bem mais pesadas, bem mais exigentes, bem mais destrutivas, bem menos remuneradas, sim tudo isso é verdade. Mas Pedro sabia o que era ser enfermeiro. A maior parte dos comuns mortais nem sonha o que isso é. Outra grande maior parte só pensa: "lá estão estes gajos outra vez de greve, só sabem é estar sentados, recebem bem e ainda se queixam". Pois é mas Pedro estava farto desta lenga lenga, já nem queria saber o que pensavam as outras pessoas, ou até o seu chefe. Que se lixe. Pedro estava farto de ser aquele que se sentava na cabeceira dos utentes e ouvia os seus desabafos, que ouvia os gritos de dor de muitos utentes, os medos, os choros em silêncio. Pedro estava farto de ser maltratado por doentes que exigiam, que eram mal educados, quando o mesmo Pedro andava literalmente a correr no corredor para chegar a todos os utentes. Pedro estava farto de tudo, dos médicos que o pressionavam, dos familiares que exigiam, dos auxiliares que mandavam vir, dos colegas de trabalho que cortavam na casaca. Acabava mais um turno, Pedro precisava de respirar, está neste momento a guardar a bata no armário e nesse preciso instante pensa que não quer mais esta vida de enfermeiro para ele. Rapidamente acorda e sabe que não pode ser, alguém tem de pagar as contas...